Então

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Tarde demais





Por Izabel Campana
Parece que foi Fernando Sabino quem disse, em crônica sobre Paris, que sentia ter chegado à cidade tarde demais. Eu tive uma experiência muito parecida quando cheguei ao Rio de Janeiro pela primeira vez. 40 graus, 40 anos atrasada.
Fui morar no Rio em 2007. Tenho que admitir, mesmo temendo a reação raivosa que certamente virá dos amigos cariocas, que me decepcionei.
Não vi nada daquilo que eu esperava. Queria ver o Rio de Tom e Vinícius. Sim, gente bonita a desfilar por praias de tirar o fôlego. Fervor de beleza, paraíso tropical dos hedonistas. Mas também queria ver muita gente inteligente. Queria ver o Rio centro pensante do país.
Queria ter estado lá para ver os gênios. Só de escritores, uma boa penca. O próprio Sabino, Rubem Braga, Manoel Bandeira, Clarice Lispector, Drummond. Isso só para citar alguns. E Nelson Rodrigues, meu herói de infância. É, eu sei, fui uma criança esquisita.
E para falar mais dos jornais: Stanislaw Ponte Preta, Carlos Castello Branco, Otto Lara Resende, Paulo Francis, Paulo Mendes Campos. Quer mais?
Tinha mais. A melhor música, a melhor vida noturna. O melhor que vinha de fora. Passou por lá, sim senhor. Queria ter estado no Rio para ver Noel Rosa, ou mesmo João Gilberto, quando ainda saía de casa. Além do melhor do futebol. Garrincha, Didi e o milésimo gol do Pelé no Maracanã.
Queria ter visto o Rio de Janeiro capital. Não balneário. Com figuras históricas interessantes. Queria assistir Missa do Galo na Corte e trocar umas idéias com Lima Barreto numa mesa de bar.
Mas a verdade é que o Rio não envelheceu bem. Perdeu os melhores dentes. Os da frente. E quando eu cheguei, nada daquilo que cresci ouvindo Tom e Vinícius cantarem estava lá.
Copacabana, Princesinha do Mar, imprópria para banho. A verdadeira Garota de Ipanema são hoje senhoras de 80 anos. Vão à praia de toca e penhoar e lotam as filas do banheiro do Cine da Roxy nas tardes de domingo.
Foi substituída por um outro ser. Uma mulher bombada, betacarotenada, siliconada e oxigenada, que não é cheia de graça.
Além da Barra da Tijuca, que encaixotou todo mundo em condomínios fechados e roubou o Glamour do posto 7.
Belezas naturais? Desde que o Gabeira meteu uma tanga fio dental e foi à praia, a paisagem não é mais segura. E quando a praia deixa de ser refúgio, o calor do Rio vira tortura. A primogenitura por um ar-condicionado!
Não é que tudo fosse ruim quando morei lá. Sinto falta de muita coisa do Rio. Os amigos, em primeiro lugar. Creio que seja bom adulá-los para ver se não perco a amizade.
Andanças pela Barata Ribeiro para tomar um suco, entrar num sebo. Visitar as livrarias, as galerias, e um honesto  restaurante chinês do centro da cidade.
Mas não. O Rio não é mais aquele que recebeu Brigitte Bardot. Assim como Brigitte Bardot não é mais aquela que visitou Búzios.
Mas também, talvez eu é que esperasse demais. Tinha feito na cabeça uma imagem de fantasia com narração de Paulo Francis, trilha sonora de Noel Rosa e fotografia de Gervásio Baptista.
Esperava encontrar um Rio de Janeiro que não é só de outra época. É de outras épocas. E é tarde demais para acreditar nesse Rio de Janeiro que sempre existiu só na minha imaginação.

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